Ao naturalizar "fake news", Bolsonaro prepara terreno para 2022, avaliam especialistas

 
Ao comparar informações fraudulentas a “mentirinhas”, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tenta naturalizar uma prática de desinformação, avalia a cientista política Monalisa Torres, docente da Universidade Estadual do Ceará.

A fala de Bolsonaro foi feita nesta terça-feira, 14, durante a cerimônia de entrega do Prêmio Marechal Rondon de Comunicações. O chefe do executivo nacional comparou fake news a “mentirinhas contadas para a namorada”, e disse que a disseminação do conteúdo falso não deveria ser regulamentada no País.

O discurso é uma defesa da Medida Provisória (MP) 1.068/2021 editada pelo governo, em 6 de setembro, para criar obstáculos para os moderadores das redes sociais excluírem os conteúdos que julgarem falsos, por exemplo.

“Não é de hoje que mentiras são contadas, sobretudo nas campanhas eleitorais para cativar o eleitor. Agora, o problema é a forma como essas mentiras são disseminadas”, explica a docente.

Segundo Torres, há uma instrumentalização das notícias fraudulentas e distorção de informações que favorecem mobilizações políticas. A professora cita o exemplo das manifestações pró-Bolsonaro ocorridas no último dia 7 de setembro, Dia da Proclamação da República. Na data, defensores do presidente chegaram a anunciar que o governo havia decretado estado de sítio no País, situação que nunca ocorreu.

“A própria estória de que o Brasil teria entrado em estado de sítio mostra como as fake news estão cada vez mais inseridas na nossa realidade. E isso não é uma coisa boa”, alerta.

A prática tem sido constantemente utilizada pelo presidente e apoiadores para descredibilizar instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o próprio sistema eleitoral, com o questionamento constante sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas.

Helena Martins, professora de Comunicação Social da Universidade Federal do Ceará afirma que, com o exemplo, o presidente tenta criar uma confusão entre o que é público e privado para minar o debate público. A característica, ela avalia, é semelhante a de governos de matriz fascista que negligenciam a importância da informação para a sociabilidade.

As duas pesquisadoras avaliam que as declarações criam um ambiente fértil para naturalização de mentiras que serão benéficas ao presidente na campanha de 2022. Isso porque ele já cria um ambiente de descredibilização das urnas e instituições do país, para o caso de derrota eleitoral. Além disso, foi e deverá ser novamente favorecido pela divulgação massiva de informações falsas na Internet durante a campanha.

MP foi devolvida, mas serviu ao propósito

A manifestação de Bolsonaro ocorreu no mesmo dia em que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), anunciou a devolução da MP que alterava o Marco Civil da Internet. A medida criava obstáculos para os moderadores exclusão de conteúdos fakes de redes sociais.

Na avaliação de Torres, a MP 1.068/2021 tinha o objetivo de permitir que informações de todo tipo pudessem ser divulgadas nas redes sociais no dia 7 de setembro, para mobilizar o máximo de apoiadores. Dessa forma, mesmo com a revogação, a medida já teria cumprido a função para a qual foi designada, analisa a docente.

O discurso do governante também passa pelo debate sobre a regulação da mídia no país, afirma Helena Martins. Ao falar que a liberdade de expressão deve ser mantida, o mandatário vai contra o debate sobre a regulação da mídia e das plataformas digitais.

“Bolsonaro ao mesmo tempo que reduz o problema também afasta possibilidade de um necessário debate público sobre a regulação das plataformas digitais”, disse Martins.

Repercussão

O site do ex-presidente Lula (PT), principal adversário de Bolsonaro para as eleições de 2022 publicou texto em que se afirma que o atual mandatário teve um “lapso de honestidade” ao assumir que a mentira faz parte da vida dele. O texto ainda classifica o atual presidente como “Rei da Mentira”.

Fonte: O Povo


Postar um comentário

0 Comentários